Por: Lucas Martins

"E também houve entre o povo falsos profetas, como entre vós haverá também falsos doutores, que introduzirão encobertamente heresias de perdição, e negarão o Senhor que os resgatou, trazendo sobre si mesmos repentina perdição" (2 Pedro 2:1). Alguns irmãos defendem que é impossível Cristo ter morrido por alguém e este alguém se perder. Agora, parece que o texto de 2Pedro aponta exatamente para essa possibilidade, já que um grupo de hereges por quem Cristo teria morrido aparentemente negaram o seu Salvador e se perderam. Então, alguns calvinistas sugerem algumas interpretações para esse texto, e uma elas que vi recentemente é esta: AQUELES que estão entre VOCÊS rejeitaram o Senhor que resgatou VOCÊS, e ELES se perderam. Isso porque, se Cristo de fato resgata alguém, no calvinismo, essa oferta não pode ser negada. Se o texto de 2Pedro 2 disser mesmo que Cristo resgatou até mesmo estes que perecem, então toda a doutrina calvinista da “expiação limitada” cai. Eis a questão: o Senhor resgatou aqueles homens que o negaram e pereceram? Resgatou ou não resgatou? A gramática do texto grego aponta que sim, Cristo morreu também pelos que perecem. Há algumas excelentes razões para defender essa ideia. Vejamos o texto: "E também houve entre o povo falsos profetas, como entre vós (en hymin, 2.ª Pessoa, Dativo) haverá também falsos doutores, que introduzirão encobertamente heresias de perdição, e negarão o Senhor que os (autous, 3.ª Pessoa, Acusativo) resgatou (Acusativo), trazendo sobre si mesmos repentina perdição".
1 - O "resgatou" está no caso acusativo assim como "autous" (eles), e não no caso dativo como "en hymin" (em/entre vós). Só por ser o mesmo caso, já dá pra ver que o "resgatou" se refere a eles. Pedro fala "resgatou ELES" (autous) e não "resgatou VOCÊS" (hymin). A interpretação calvinista diz: "ELES negaram o Soberano que resgatou VOCÊS", mas o texto diz: "ELES negaram o Soberano que OS resgatou [que resgatou ELES] (agorasanta autous)”.
2 - "Autous" e "hymin" não apenas estão em casos diferentes, mas são PESSOAS diferentes. Pedro se refere à igreja falando “vós”, e aos outros falando “eles”. Autous é terceira pessoa (eles). Hymin é segunda pessoa (vós). Ou seja, não é possível interpretar o “autous” como se ele fosse o mesmo pronome “hymin” que aparece lá em cima. Pedro diz "OS resgatou" e não "VOS resgatou". A diferença é sutil, mas uma boa teologia precisa ser rigorosa no trato com o texto bíblico.
3 - Em grego, assim como em português, existe essa regra básica: "o pronome concorda com o antecedente em gênero e número". Por exemplo, na frase “Eu amo Fulana. Eu a amo.”, o pronome “a” tem que concordar com o antecedente “Fulana” em gênero e número, que no caso é Feminino Singular. Por outro lado, aqui no texto bíblico, estamos procurando qual é o antecedente do pronome “autous". Ele está no MP (Masculino Plural), então temos que ver simplesmente quais antecedentes também estão MP e aí a gente mata a charada.
Leiamos o texto novamente: "E também houve entre o povo falsos profetas (MP), como entre vós (-P) haverá também falsos doutores (MP), que introduzirão encobertamente heresias de perdição, e negarão o Senhor que os (MP) resgatou, trazendo sobre si mesmos (MP) repentina perdição".
Bem, quem foram os resgatados pelo Senhor? "Vós"? Claro que não, porque o pronome deve concordar em gênero e em número, e "vós" nem gênero tem! Os resgatados pelo Senhor são aqueles que também estão no Masculino Plural: falsos profetas, falsos doutores e aqueles que trouxeram sobre si a perdição. Por que as pessoas são condenadas? Porque Deus não quis salvá-las ou porque elas rejeitaram a salvação oferecida (Jo 1:11-12, 3:14-19, Rm 9:30-33)? Podemos dizer que aqueles falsos mestres se perderam não porque lhes faltou resgate, mas porque eles negaram o Soberano que os resgatou (a palavra para “resgatou” é tipicamente salvífica, também usada em 1Co 6:20 e Ap 5:9). Sendo assim, usar esse texto para defender uma “expiação limitada” gera mais problemas do que soluções. Confiantemente, podemos dizer que Cristo morreu por todos (Hb 2:9, 1Tm 2:3-6, 1Jo 2:2), inclusive pelos que perecem (2Pe 2:1, Rm 14:15).

Referências: 
Aprendendo o Grego do Novo Testamento, Philip Dunaway



Por: Janderson Torres

Tradução de trechos: Luiz Henrique






Matéria sensacional sobre o "avivamento calvinista" norte-americano. Será que vemos alguma relação com o que está acontecendo no Brasil?¹


Trechos: "Um dos marcadores do movimento neo-calvinista é o isolacionismo. Os meus amigos reformados consomem blogs calvinistas, livros calvinistas, assistem a conferências calvinistas, e juntam-se a igrejas calvinistas com pregadores calvinistas. Eles raramente aprendem ou se envolvem com aqueles que estão fora de sua tradição...."


"Outra tendência preocupante que vejo no movimento [neo-calvinismo] é o tribalismo. Esta é a tendência de parentesco dentro de um grupo para proteger os de dentro enquanto luta contra os de fora."


"...Tribalistas tentam 'limpar a casa' quando se trata de pessoas de fora, mas "varrer para debaixo do tapete" quando se trata dos de dentro."


"Como Roger Olson, professor da Universidade de Baylor e autor de 'Contra o Calvinismo', me disse, '[Neo-calvinistas são] uma tribo, e eles fecharam fileiras. De alguma forma, eles formaram uma mentalidade que eles têm de apoiar uns aos outros, porque eles são uma minoria em uma cruzada. Qualquer crítica fere a causa. Eu vi a mesma coisa entre as feministas e teólogos negros'."


"Há um ethos fundamentalista no [neo-Calvinismo]", diz Olson. 'Você recebe tapinhas nas costas e méritos por criticar os de fora, mas não por criticar os de dentro. Há um sistema em que se você é um jovem chegando nas fileiras, você ganha pontos por criticar ou expor aqueles que estão fora do movimento, mas não é o seu dever criticar aqueles que estão acima de você no próprio movimento'."


"A perspectiva de muitos hoje é que se você não é um calvinista, você realmente não tem uma compreensão do evangelho", diz Olson.






Vale a pena dar uma conferida na matéria completa e fazer suas comparações com o Movimento reformado no Brasil.




1- http://religionnews.com/2014/05/20/troubling-trends-americas-calvinist-revival/, acessado em 07/07/2016, às 17:34h.


Por: Janderson Torres


"Eu rogo por eles; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus." João 17:9


Dentre vários textos usados pelos calvinistas para defender uma redenção particular e exclusiva dos eleitos, esse texto é um dos mais mal empregados por tais. Admira-me o fato de os calvinistas serem conhecidos por uma boa teologia e serem dedicados na exegese bíblica, carregarem o lema “SOLA ESCRIPTURA” consigo, e ainda assim, fazerem uma completa eisegese desta passagem.

Segundo as regras de interpretação bíblica, esse texto NUNCA poderia ser usado para tecer algum comentário sobre EXPIAÇÃO. Não há nada, nem neste texto, nem no contexto do capítulo, que nos indique que Jesus está tratando sobre os benefícios e o alvo de sua morte vicária. O que de fato esse texto está tratando? 

Acho que qualquer leitor bíblico (sem os óculos calvinistas) traria o real sentido desta passagem numa leitura breve, onde a chave para o entendimento estaria logo no início da frase: “Eu rogo...”. Está bem claro qual é o tema desta passagem, a saber – A ORAÇÃO de Jesus em favor dos seus escolhidos – veja bem: A ORAÇÃO e não A EXPIAÇÃO de Jesus pelos seus escolhidos. Até agora não sei como, por conta desta oração, alguém poderia chegar à conclusão que Jesus morreu APENAS pelos eleitos. Talvez aos que se propõem a fazer esse link, faça uma verdadeira cambalhota exegética. Mas, digamos que essa afirmativa seja verdadeira, que o simples fato de Jesus ter orado pelos eleitos, concluamos que a sua morte foi em favor apenas destes. Então temos uma regra simples: Todos aqueles em que foram alvo das orações de Jesus são os beneficiários da sua morte. O que os Calvinistas não percebem é que Jesus também orou pelos NÃO ELEITOS. Ainda agonizando o sofrimento da cruz, Jesus diz: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem.” Lucas 23:34a. A pergunta que fica é: quem era o alvo desta oração de Jesus? A resposta óbvia é que o alvo desta oração eram aqueles que crucificaram injustamente a Cristo. Lembrando-se da regra que mencionei logo acima, que todos aqueles em que foram alvo das orações de Jesus são os beneficiários da sua morte, nesta perspectiva temos duas alternativas: 1- Os que participaram direta ou indiretamente da injusta crucificação de Jesus eram eleitos também. 2- A morte de Jesus, por conta desta oração, foi também em favor dos NÃO ELEITOS.


A primeira alternativa é descartada logo de cara, pois bem sabemos que aqueles que cometeram essa injustiça com Jesus não faziam parte do grupo de eleitos, pois os mesmos rejeitaram ao Senhor Jesus. O que nos resta então é a segunda opção, de que o fato de Jesus ter orado por pessoas que não fazem parte dos eleitos, fazem estes, alvos de sua morte. Percebam que se os calvinistas levarem até as últimas consequências essa lógica terão também que trabalhar com a ideia de que Jesus morreu também pelos não Eleitos.

Como vemos, a interpretação calvinista deste texto é completamente anômala, comete sérios erros de interpretação e depõe contra sua própria posição.

Vale ressaltar também, que ao fazer essa interpretação, os calvinistas fazem um paralelo antagônico entre os eleitos (expresso no texto “[... por eles...], [... aqueles a quem tu me deste] e [... teus]”.) e os não eleitos (expresso no texto pelo termo “mundo”), usando abertamente a expressão “mundo” como os réprobos. É curioso notar que nas suas epístolas, o Apóstolo João faz também os mesmos paralelos entre os eleitos, expresso pelo termo “os seus” e o "mundo". Por exemplo: “Sabemos que somos de Deus, e que todo o mundo está no maligno.” (1 João 5:19). João nitidamente faz um paralelo entre aqueles que são de Deus e aqueles que são do mundo. E entendemos que aqueles que são de Deus, como os eleitos e os que são do mundo como os não eleitos. Temos outro exemplo: “Vede quão grande amor nos tem concedido o Pai, que fôssemos chamados filhos de Deus. Por isso o mundo não nos conhece; porque não o conhece a ele.” (1 João 3:1). Mais uma vez, esse paralelo para João é bem perceptivo aos nossos olhos em que nesses casos, onde há esse paralelo, mundo significa NÃO ELEITOS, mas até aqui tudo bem para os calvinistas. A coisa começa a ficar complicada quando vamos para a mesma epístola de 1João, mais precisamente no segundo capítulo, lemos: “E ele é a propiciação pelos nossos pecados, e não somente pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo.” (1 João 2:2). Acompanhando a coerência e o uso de João do termo “mundo”, fica fácil de entender e de interpretar esse texto. Se toda vez que acontece esse paralelo entre “mundo” (não eleitos) e “nós” (eleitos), entendemos que Jesus é a propiciação não apenas dos “eleitos”, mas também dos “não eleitos”.

Fica incoerente para os calvinistas, aplicarem uma regra interpretativa em um caso (João 17:9) e no mesmo caso em (1João 2:2), aplicarem outra regra. Parece-nos bem aquele jargão: “Dois pesos e duas medidas”, essa expressão resume bem a interpretação calvinista deste texto. Por isso um calvinista que nega a expiação universal à luz de um texto como este teria que corromper o significado de “mundo”, de “todos” e de “não somente”. Em termos simples, teria que corromper tudo e esquecer este texto.

Antes que alguém me condene por fazer uma análise de texto em livros diferentes, usando textos do evangelho de João e o relacionando suas epístolas, gostaria de lembrá-los que esse tipo de relação não teria muita eficácia, caso os autores fossem diferentes e as épocas de escritas fossem diferentes, como não é o caso em questão. Mas essa relação é feita comumente com Paulo, quando estudamos algum assunto de suas epístolas, e vemos a ocorrência de algum termo em todas as suas epístolas para entendermos melhor o significado do termo. O estudo da ocorrência de termos, ás vezes é feita até com autores diferentes, como por exemplo: As obras e a justificação, a aparente contradição entre Paulo e Thiago. Quanto mais próximo do autor for esse estudo, melhor será para o intérprete. Enfim, precisamos entender como um autor atribui um termo em todas as suas epístolas, pois, se conseguirmos traçar um perfil dessa atribuição, certamente estamos enveredando por um caminho seguro na interpretação de um texto.


Por fim, fico com as palavras de Ambrósio, um dos pais da Igreja (340-407):
 “Cristo sofreu por todos, ressuscitou por todos. Mas se alguém não crê em Cristo, ele se priva deste benefício geral.” Ele também disse, “Cristo veio para a salvação de todos, e garantiu a redenção de todos, porquanto Ele trouxe um remédio pelo qual todos podem se salvar, embora haja muitos que… estão indispostos para serem curados”.